sábado, 17 de junho de 2017

Primeira imagem com a QHY163

Nebulosa da Lagoa, capturada com a QHY163m no refrator de 102mm. Foram 36 frames de 2 minutos com filtro H-alpha e 10 frames de dois minutos para os filtros de Oxigênio 3 e Enxofre 2. Composição em Hubble Palette.

Finalmente chegaram as câmeras QHY163m e QHY5III-224c que adquiri no Tellescopio.com. Ou melhor, na verdade elas chegaram bem antes do que eu esperava. O site dizia que faria as encomendas no dia 31 de maio. E como as câmeras viriam da China, eu esperava, na mais otimista das expectativas, que elas chegassem no meio de julho, antes do Encontro Brasileiro de Astrofotografia. Quando recebi a mensagem, dia 9 de junho, de que as câmeras estavam sendo preparadas para envio, foi uma tremenda surpresa.

As câmeras chegaram na terça e eu já comecei a utilizá-las na quarta-feira. De cara percebi uma desvantagem das QHY em relação aos modelos da ZWO. Enquanto as ZWO já eram encontradas pelos softwares que utilizo, as QHY precisam mais de um sistema chamado de ASCOM para conversarem com softwares astronômicos. Num primeiro momento eu fiquei meio chateado. Sempre achei que trabalhar com ASCOM era coisa para engenheiros e a documentação existente na internet não ajuda muito. Felizmente, descobri que é muito mais simples do que eu pensava. Fuçar um pouco já resolveu o problema. Você precisa apenas, instalar os drivers da câmera, encontrar os drivers no ASCOM, como se estivesse abrindo a câmera num software de captura, e depois disso basta selecionar a "câmera" ASCOM no software de captura. O software até vai perguntar qual câmera eu quero conectar. Isso aconteceu comigo por que tenho duas câmeras QHY conectadas ao mesmo tempo.

Como diz o José Carlos Diniz, as câmeras astronômicas com sensores CMOS são bichos diferentes das câmeras com sensor CCD. A principal diferença que vemos logo de cara são as opções de ajuste de Ganho e Offset. O ajuste de ganho é bastante claro, equivale ao ajuste de ISO das câmeras DSLR que conhecemos. Já o ajuste de OFFset está relacionado com o ajuste do nível da cor preta. Eu entendo mais do ganho. Sei que mais ganho gera mais ruído, mas permite frames mais curtos e uma maior quantidade de frames pode compensar o maior ruído. Mas selecionar os melhores valores para estes ajustes pode afetar o Range Dinâmico da câmera. Pelo que vi, valores maiores são interessantes para objetos muito pálidos e de brilho uniforme, como nebulosas de emissão extensas, mas para nebulosas com muita variedade de brilho, como a Nebulosa da Lagoa, de Orion, ou Galáxias, que têm um núcleo muito mais brilhantes que o resto do corpo, um maior ganho e mais OFFset pode gerar imagens estouradas (o OFFset também afeta o range dinâmico). Desculpem se falei besteira, mais para frente quero entrar mais a fundo neste assunto, que gera dúvidas até entre astrofotógrafos mais experientes. Felizmente, a QHY163 já veio com um preset de ganho e OFFset para céu profundo e podemos utilizar estes parâmetros pré-definidos. Mesmo assim eu aumentei um pouco o ganho para 30, o que provavelmente gerou o estouro do núcleo da Nebulosa da Lagoa na imagem do início do post.

Eu já tinha utilizado uma câmera astronômica resfriada com sensor CMOS, a ASI174. E agora com a QHY163 percebo que nestas câmeras é normal que determinadas regiões apresentem clareamento de áreas do sensor. Esse clareamento é chamado de Amplifier Glow e pode ser totalmente retirado com o uso de Dark Frames. A ATIK314L+ nunca apresentou este tipo de alteração nos frames. Então, se na Atik 314L+ eu podia até dispensar dark frames, em câmeras CMOS eles são obrigatórios.

Depois de tanto tempo com o pequeno sensor 2/3 de polegada da ATIK314L+, ter uma câmera com sensor 4/3 de polegada (o dobro da diagonal e 4 vezes mais área) é algo maravilhoso. É muito mais fácil encontrar e enquadrar os objetos e a perda de campo na troca de filtros não causa arrepios. Mas algo que me preocupa com a QHY163 é em relação à vinhetagem. A câmera tem um sensor praticamente do tamanho do diâmetro de um filtro de 1,25 polegadas. Na imagem que vemos acima eu fiquei na dúvida se houve ou não vinhetagem. As bordas estão um pouco mais escuras do que o resto da imagem. Mas também estão azuis. Os flat frames mostraram vinhetagem bem nos cantos da imagem, mas que pode ser totalmente retirada com a aplicação destes frames de calibração. A verdade é que se o setup apresentar vinhetagem na imagem final, eu vou conviver com isso por um bom tempo, pois filtros de 2 polegadas são muito mais caros do que os de 1,25 polegadas e repor todo meu conjunto de filtros, RGB, IR/UV Cut e banda estreita, além da roda de filtros, pode custar um bom dinheiro.

A imagem acima não teve uma captura perfeita porque eu estava com pressa de ter uma experiência completa com a nova câmera. Não quis perder tempo com alinhamento e a guiagem, feita com a também nova QHY5-III 224c não aguentaria mais do que dois minutos por frame sem deixar rastros. Mas o relaxo mesmo foi no foco. O software que eu utilizei foi o EZcap, desenvolvido pela própria QHY e ele tem a função de assistente de foco, mas nem me dei ao trabalho de usar.

Apesar de tudo, fico muito feliz com essa primeira imagem e tenho certeza de que, com mais apuro, imagens fantásticas estão por vir.

Abaixo, algumas imagens interessantes que mostram as características do setup utilizado:

Flat frame feito com a QHY163 com roda de filtros de 1,25 polegadas mostra leve vinhetagem nas bordas da captura, provocado pelos filtros praticamente do tamanho do sensor.

Dark frame (com aumento de brilho) mostra áreas mais claras na imagem, efeito chamado de Amplifier Glow. A câmera estava com sensor em temperatura de cerca de zero grau

Light frame H-alpha (com brilho aumentado) mostra como áreas mais claras aparecem, mas serão eliminadas com a aplicação dos darks.

Canal H-alpha com integração de 36 light frames, 10 darks e 30 flats.
Setup utilizado na captura. Vemos a QHY163 no telescópio principal, com roda de filtros de 1,25 polegadas, o aplanador de campo da Orion à frente da roda de filtros. Também vemos a QHY5III-224 com lente Nikon de 135mm F2.8 como telescópio de guiagem. A montagem é a HEQ5 da SkyWatcher.




domingo, 4 de junho de 2017

O Problema do Mercado de Equipamentos Usados em Astronomia

Desde a crise econômica e alta do dólar, uma das coisas que mais se tem falado dentro da Astronomia Amadora e mais ainda na Astrofotografia amadora, mais dependente de equipamentos, é a elevação exponencial dos preços dos equipamentos de Astronomia para o público brasileiro. Ah, não tem como não lembrar que eu paguei apenas 2900 reais na minha Sky-Watcher HEQ5, montagem computadorizada capaz de carregar o meu refletor de 200mm em sessões até de capturas de céu profundo. Enquanto isso, dias atrás tinha um cara no Mercado Livre vendendo uma EQ1 por mais do que isso. Uma montagem que não consegue carregar nem um pequeno refrator de forma aceitável para fotografia de céu profundo. E pior, a montagem nem sequer tinha motorização. Após muitas reclamações ele baixou um pouco o preço. Mesmo assim ficou acima de dois mil reais. No mínimo o dobro do que a montagem normalmente custa, mesmo nesta época de dólar alto.

Estes dias vi um post no Facebook reclamando sobre os preços abusivos que estão cobrando por equipamentos astronômicos. Achei interessante um comentário dizendo que "muitos astrofotógrafos se fazem de santos, mas também cobram preços abusivos por seus equipamentos". Bem, vou dizer a minha opinião sobre isso.

Se um astrofotógrafo tem uma câmera, que ele acha que é muito boa e sabe que ela vale muito e que tem gente disposta a pagar por isso. Não existe absolutamente nada de errado dele cobrar um alto valor pelo equipamento. Se ele comprou barato no exterior, foi por que também gastou com passagens, hotel e outras coisas para adquirir o produto. Se quando ele comprou a câmera o dólar estava baixo, agora está alto. Ele pode estar vendendo o produto porque está querendo fazer um upgrade e vai ter que pagar o preço atual do dólar por este novo equipamento. Não tem como ele entrar numa máquina do tempo e comprar o produto novo pelo dólar de 2014. Ele também pode não estar a fim de vender o produto tão cedo. Muitas pessoas fazem isso com imóveis, por exemplo. Quando você compra uma casa de um casal recém divorciado, pode ser que consiga um excelente preço. Mas se está de olho na casa de um morador que não está com pressa nenhuma de sair de sua residência, pode ter que pagar caro pelo imóvel.

O verdadeiro problema está no fato de que, na verdade, a maioria dos astrofotógrafos vende seus produtos usados por preços bastante em conta, só que parece que existem pessoas nos grupos de vendas de equipamentos que estão se especializando em adquirirem rapidamente produtos ofertados por valores baixos, para pouco depois revenderem por valores muito mais elevados. Elas acabam comprando o produto antes de quem realmente vai utilizar o equipamento, impedindo de comprar por um bom preço e o obrigando a pagar um valor muito maior do que o inicialmente ofertado. Para mim, é quase como um sequestro do equipamento, mas quem faz isso é mais conhecido como atravessador, neste caso, um atravessador oportunista.

No mercado de usados é possível diferenciar um atravessador de um astrônomo ou astrofotógrafo legítimo. Geralmente o atravessador tem pouco conhecimento do produto que está ofertando. Ele vai dizer algo como: "comprei e só usei duas vezes, por isso não sei muito sobre o produto". Pode até mesmo dizer que comprou, mas teve um problema financeira e nem usou, apenas tirou da caixa. Por isso, não sabe muito. Pelos anúncios deles nestes grupos você vai chegar a conclusão de que estes caras estão com um sério problema de indecisão, adquirindo vários produtos e só usando umas duas vezes. Ou mesmo, quando ele assume ser um atravessador, o que não é incomum, você pode achar que equipamentos de astronomia não servem pra muita coisa, pela quantidade de pessoas que compram equipamentos caros e usam somente duas ou três vezes antes de passar o produto para os atravessadores.

Não existem soluções fáceis contra este problema. O ideal seria o boicote contra estes vendedores enquanto eles estiverem pedindo preço que sejam abusivos. Por abusivo, entenda-se não somente o preço final, mas se você notar que estão aparecendo produtos a venda em fóruns de Astronomia e logo depois eles reaparecem a preços muito mais altos, recomendo evitar estes vendedores. Eles não são astrônomos vendendo produtos que usaram, são só gente que se aproveitou de uma pessoa pouco ambiciosa para lucrar em cima do vendedor e do comprador.

Atravessadores também costumam ter uma gama de produtos que pode estar acima do considerado normal para um astrônomo amador. Mas também não tenha preconceito achando que só por que o cara é um atravessador, merece ir para o inferno. Estes grupos também têm (poucos) bons atravessadores. Que podem praticar preços justos. Antes de comprar seu produto, pesquise o preço do equipamentos no exterior. Não compre nada que esteja mais em reais do que o preço em dólares multiplicado por dez. Por exemplo, se algo custa 100 dólares nos Estados Unidos, um preço acima de 1000 reais no Brasil tem grandes chances de estar abusivo.

O mais recomendado é, se você precisa de algo importante e espera adquirir no mercado de usados: acompanhe os fóruns e sites de vendas com muita frequência e quando aparecer um produto por um preço justo, que esteja sendo vendido por alguém que claramente prática astronomia, não espere muito para adquirir, ou peça para o vendedor reservar o produto por uns dois ou três dias, enquanto você pesquisa para saber se vai fazer a melhor compra. 

Mesmo produtos que pareçam baratos à primeira vista podem enganar o consumidor leigo. Esses dias, tinha um atravessador vendendo uma Imaging Source DBK41 usada, por dois mil reais, alegando que a câmera custava quase 500 dólares lá fora. Pode parecer uma boa oferta, mas a verdade é que, apesar de ainda custar caro, a DBK41 é uma câmera ultrapassada e ninguém com conhecimento compraria essa câmera por esse preço. Uma QHY5 ou uma ASI120 fariam imagens muitíssimo superiores, possuem entrada ST4, para autoguiagem e podem ser encontradas novas por cerca de mil reais, ou até menos quando usadas.

O mais correto é sempre procurar alguém com conhecimento antes de adquirir qualquer equipamento. Em grupos respeitados de redes sociais, como o "Equipamentos Astronômicos" é possível encontrar muitos astronômos amadores experientes dispostos a ajudar os iniciantes; Muitos vezes vemos até amadores experientes questionando sobre produtos nestes grupos. Informação nunca é demais.

No próximo post, eu fiz um levantamento de informações dadas por colegas no Facebook e Whatsapp sobre importação direta de equipamentos e vou compilar elas aqui pra vocês.